Maratona de Boston na visão do cadeirante Carlos Oliveira

Por Carlos Oliveira (Carlão) | 26/04/2006 – Atualizada às 14:58

Fonte: http://yescom.webrun.com.br

Carlão em treino nos Estados Unidos
Foto: Arquivo pessoal

A mais antiga maratona do mundo, Boston, completou sua 110ª edição na última semana. A prova, que reuniu atletas de diversas nacionalidades, tem algumas peculiaridades. O maratonista brasileiro, Carlos Oliveira, participou da prova em 2003. Ele representou o país na categoria cadeirantes. Sim. Carlão, como é conhecido, correu os 42,195km de prova numa cadeira de rodas.

Para relembrar esse momento, que ficou na memória do atleta e também na história, já que ele foi o primeiro cadeirante brasileiro de Boston, Carlão conta como foi essa experiência única. “No local destinado à preparação dos cadeirantes estavam mitos. Só feras. É bom estar no meio da elite”. Confira a experiência de Carlão em Boston.

Porto Alegre – No último dia 17 de abril foi realizada nos Estados Unidos a Maratona de Boston 2006, prova fantástica com a maior premiação em dinheiro para corredores cadeirantes. Eu tive a oportunidade de participar dessa prova em 2003 como o primeiro atleta brasileiro em cadeira de rodas. Fiz a projeção de finalizar entre os 20 primeiros colocados e consegui. Terminei a prova na 19ª colocação. Foi também naquele ano que a barreira de 1h20min da modalidade cadeirante caiu. O sul-africano Ernst Van Dyk fechou a prova em 01h19min.

O dia da prova amanheceu com presságio de sol e ameno, clima atípico naquela época do ano na região. Na verdade estava quente para a estação. Cheguei cedo, bem antes dos demais corredores, que vão de Boston para a largada em ônibus especial, visto que a prova larga da cidade de Hopkinton, uma cidadezinha com ares rurais. A “main street”, local da largada, fica abarrotada de gente, atletas, técnicos, políticos, personalidades, estandes de patrocinadores, que dão desde protetor labial, até tênis e camisetas. Em um furgão de uma operadora de telefonia móvel, liguei, de graça, ou como eles falam “free”, para o Brasil, coisas de patrocinadores.

No local destinado à preparação dos cadeirantes, o ginásio de uma escola “High School”, bastante espaçoso, tinha água, lanche, frutas, tudo que era necessário para a pré-largada dos atletas. Lá estavam mitos como Franz Nietsplach, Ernst Van Dyk e outros. Só feras. É bom estar no meio da elite!

Na linha de largada os corredores se alinham conforme os tempos de “qualifying”, que são checados rigorosamente pela direção geral da prova. Eu larguei na segunda fila com o número 16. Os primeiros 1500m são percorridos com um “carro madrinha”, para evitar acidentes. O trecho inicial é um cotovelo em descida que possibilita alta velocidade, por isso o cuidado. Depois desse estágio são “braços para que te quero”, muitos braços. Pega-se a 154 Rote, passa-se pela cidade de Ashland e Framingham e vai embora. Lá no quilômetro 30, mais ou menos, tem uma das mais temíveis subidas que já encontrei em todas as maratonas que disputei (Boston é conhecida como a Maratona das quatro montanhas. E essa é a última).

Animação dos espectadores

Passa-se depois em frente ao Boston College, que é a universidade de Boston, onde o leito de rolamento da prova fica ladeado de alunos e alunas que recebem os corredores muito bem. Lá eles servem como bálsamo para os corredores extenuados. Muitas brincadeiras acontecem, como era de se esperar de jovens estudantes. As meninas da Universidade gritam e apóiam os meninos que estão correndo. Já os meninos estudantes apóiam e elogiam as meninas corredoras.

É curioso reparar nas camisetas desses alunos que tem dizeres como: “se você não tem namorado(a) o meu número de telefone é tal”, “após a corrida me procure, sou o fulano(a)”, “vai número XX você é lindo(a)”, “força número Y está quase no fim”. Isso é muito bacana. Acho que para os atletas que não são da elite é o momento de maior vibração na prova. É inesquecível, um diferencial fantástico, indescritível, só vendo para poder dimensionar.

Depois é a hora de passar pela Boylston street e chegar no trecho que fica entre a Exeter street e Dartmounth street. Esta rua é a tão cobiçada linha de chegada que vem também com aquela medalha maravilhosa e a recepção ensurdecedora dos assistentes. O atleta não consegue enxergar a calçada, é muita gente, parece que toda a cidade vem assistir a Maratona. É um acontecimento que faz parte do calendário local e do país.

Foi assim que eu vi a Maratona de Boston no ano de 2003. Espero que muitos corredores brasileiros possam desfrutar dessa emoção e quero voltar lá em breve.

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